10.9.23

Ainda sobre Setembro

Por esta altura do ano, costumamos estar a entrar no Outono. Aliás, as árvores já não estão no auge do verde lustroso e já se vêem montes siginicantes de folhas castanhas no chão. Por esta altura, já se anda com hoodie ou casaco. Mas hoje Amesterdão atingiu 32 graus celcius! Uma sensação desconcertante de que as coisas estão fora do lugar. O que para mim, que tanto gosto de procurar a ordem dos ciclos da natureza, e que me conheço desde sempre a organizar o caos e a entropia à minha volta, é... perturbador.

Mas talvez seja assim mesmo que as transições nos fazem sentir. Perturbados, desconcertados, nostálgicos, a fazer uma esparregata: simultaneamente com um pé no passado e outro no futuro.

Ou talvez seja assim que me sinto nesta semana em deixei a minha menina na Universidade, e o Grandalhão está fora, e o Champs anda cheio de projectos entre o mestrado e o estágio, e organizamos a casa para obras, e nos readaptamos e preparamos para mais transições.

Atenta aos filhos – sobretudo a ela - ainda tento sugerir isto e aquilo. É uma batalha perdida. A vida agora é deles e tomam as decisões que entendem certas, independentemente daquilo que eu acho que “deve ser”.  Esta minha mania de querer que o mundo se acomode ao que eu acho que devia ser...

O meu coração tem andado alternado entre a sensação de estar cheio, a rebentar de orgulho por ela estar onde quer, com a de estar pequenino, pequenino, vazio como o ninho.

Há algo de estrutural a mudar. É o fim de um bloco massivo da minha vida, diria mesmo da minha identidade como mãe, de responsável e cuidadora dos meus filhos. Claro que sou e serei sempre a mãe, mas este bloco no qual temos vivido, diariamente, há 21 anos está a chegar ao fim. Aliás, o Champs voltou para casa enquanto se lançou neste desafio mestrado e estágio, e a dinâmica é totalmente diferente. Viveu sózinho 3 anos e regressar é, tem de ser, noutros termos totalmente diferentes.

Acabou-se o quotidiano a 4. Os sermos os cuidadores, organizadores. É uma mudança enorme. Talvez tanto quanto nos termos tornado pais. Para nós e para eles, que também deixam de viver na existência de infância e adolescência despreocupada. Agora têm de tratar das compras, da comida, da roupa, do tempo que dormem, de gerir o seu tempo sem que haja alguém a criar estrutura, regras, horários.  

Estou contente e triste ao mesmo tempo. Apreensiva, a olhar para o cruzamento que aí vem, sabendo que tenho de tactear esse percurso, pôr um dos pés nesse futuro, sem que ainda tenha entendido, experenciado este que agora acontece.

Tenho imenso orgulho nos nossos filhos. No que eles são, no percurso que fizémos enquanto pais. Na estabilidade, acompanhamento, amor, atenção, presença. No que demos e no imenso privilégio que recebemos por ser pais deles. Não é um feito trivial.   

Já uma vez copiei aqui no blogue este poema de Kalil Gibran, e volto a colocá-lo:

“Your children are not your children.

They are the sons and daughters of Life’s

longing for itself

they come through you but not from you,

and though they are with you yet they belong

Not to you

You may give them your love but not your thoughts,

For they have their own thoughts.

You may house their bodies but not their souls,

For their souls dwell in the house of tomorrow

Which you cannot visit, not even in your

Dreams

You may strive to be like them

But seek not to make them like you.

For life goes not backward, nor tarries with yesterday.

You are the bows from which your children

as living arrows are sent forth.

The archer sees the mark upon the path of the infinite

And He bends you with his might

That his arrows may go swift and far.

Let your bending in the archer’s hand be for gladness;

For even as he loves the arrow that flies

So he loves also the bow that is stable.

Gosto de pensar que fomos esse arco estável. E agora teremos de engolir a agonia da partida e do ninho vazio. De sermos fortes para que possam desprender-se, fortes, confiantes e aventurar-se nos seus voos. Não é àcerca de nós. Continua a não ser. É sobre os seus caminhos rumo a um futuro que constroem, que tomam as rédeas no que podem (porque a sorte também faz parte).

Alguém dizia que é melhor a expressão “pássaros livres” ao invès de “ninho vazio”, porque este é triste e o outro celebratório. Vou internitentemente gostando mais de uma expressão, ora da outra.  

De certa forma sinto falta de uma comunidade com quem possa partilhar experiências. A vida que escolhemos deu-nos uma imensa força de casal, mas o facto de sermos tão pouco gregários, tira-nos essa partilha de experiências. Que tantas vezes encontro nos meus livros.

A verdade é que tudo muda. E que a mudança é sempre difícil – o fim de um projecto e o ínicio de outro. Uma mudança da pele do que se foi, e a que aparece como nova do que passará a ser. Entre a perda e a tristeza do que foi e o abrir espaço e entusiasmo para o que será para eles, para nós.

Setembro é mês de novos começos. E novos começos requerem mimo, paciência, e amor infinito. Na Suíça, adorava receber encomendas de Portugal. O amor que lá vinha... E que seguirá amanhã, agora como emissora.


Patrícia


2.9.23

Setembro, lua cheia e novos começos

Setembro é sinónimo de novos começos. E neste início de Setembro estávamos com uma lua cheia, ou super lua azul, auspiciando, segundo os astrólogos um momento perfeito em que se mostra ao mundo a força interior, sendo que a lua põe em destaque a nossa natureza mais original. É um momento propício a mudanças. 

Ontem foi o dia em que deixámos a nossa menina em Groningen.

Os preparativos começaram há muito tempo. A primeira vez que visitámos foi para um open day da Universidade em Outubro do ano passado. E Groningen era a primeira opção da Catarina para estudar medicina na Holanda. Visitei, pela a segunda vez em Fevereiro deste ano, acompanhando-a para fazer o exame de admissão. E agora é a sua nova cidade.

A Catarina e eu seguimos de comboio com a bicicleta. O dia foi uma aventura, com direito a um desmaio de uma rapariga no comboio. Éramos uns 12 no espaço de ligação de carruagens. Tudo carregado com armas e bagagens para se mudar para nova vida, olhares curiosos e ansiosos, línguas estranhas e familiares, feições que indicavam cargas genéticas diversas e o ar quente e pesado. No comboio a Catarina conheceu duas espanholas que tinham começado o dia às 5am em Madrid, uma no terceiro ano de IRO e outra na sua primeira visita a Groningen, para estudar marketing. Coincidentemente, esta rapariga fica também instalada no Social Hub. À chegada ao destino final fomos brindadas com uma chuvada, como que se o céu estivesse também ele a descarregar a carga que se vinha acumulando naquele bocado do comboio. 

Muitos estudantes a chegar à cidade que tem uma população dominantemente jovem. Tudo com mãos cheias de malas, bagagens, pacotes de feitios diversos. Eu e a Catarina cada uma com a sua mochila, uma pequena mala de rodas e a bicicleta. A carga - malas e caixas - ficou com o Grandalhão que a levou de carro no dia seguinte. Hóteis cheios, com familiares dos novos estudantes que, como nós, levam os filhos para a sua nova cidade. 

Passeámos pela cidade ao final da tarde, a Catarina já tinha feito a semana de introdução e já tinha referências e histórias para contar. Satisfeita. E também com borboletas na barriga com a antecipação do seu novo lugar, da sua nova comunidade, da sua nova vida.

No hotel nessa noite, ainda tivémos um episódio do alarme disparar. Todos os hóspedes, alguns em chinelos e pijama para a a rua. Os bombeiros chegaram em menos de 5 minutos. Era falso alarme. Tudo tranquilo e de volta aos seus espaços. 

As emoções estão à flor da pele. Claro que é uma enorme alegria que a Catarina siga a via que decidiu e para a qual trabalhou. Sei que é autónoma, funcional, competente, inteligente, organisada. E ainda assim, é a minha menina... Dormir com ela essa noite foi tão bom.

De manhã acordámos e a Catarina seguiu para a apresentação os colegas da sua faculdade (ainda não conhecia ninguém). O Nuno já a chegar com a carga. Fizémos o check-in, tirar tudo das malas, mais umas comprinhas e tempo de seguir porque a agenda dela está já cheia. 

O quarto é agradável e a vista ampla e desafogada. Bom para a mente continuar aberta e clara. Do seu quarto vê a torre central de Groningen. E também o seu campus.  


E lá a deixámos. Com a tristeza natural de saber que não vou ter por perto a minha menina adorada. De coração cheio, e a transbordar de orgulho tal como a superlua que nos iluminou na noite em que chegámos, porque segue com coragem o caminho que traçou para si. E isso só pode ser admirado e apoiado. Como alguém dizia, ter coragem para seguir o coração e a intuição é fundamental. "De alguma forma, eles já sabem o que você realmente se deseja tornar." 

Assim começa uma nova fase da vida. Perto ou longe, seremos sempre / estaremos sempre, para ti. 

Ultreia!

Patrícia